quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

POR QUE EXISTE O NADA?





"'Por que existe o nada em vez de alguma coisa?' Finalmente, não há resposta a isso, já que o nada procede do mito, do crime original, enquanto que algo procede do que é costume chamar-se de realidade. Ora bem, o real nunca é seguro. A pergunta passa então a ser, não 'donde vem a ilusão?', mas 'donde vem o real?' Como é possível que inclusivamente exista um efeito do real? Aí está o verdadeiro enigma. Se o mundo é real, como é possível que não seja desde há muito tempo racional? Se é só ilusão, como pode engendrar-se um discurso do real e do racional? Mas existe precisamente outra coisa além de um discurso do real e do racional? É possível que não tenha existido nunca nenhum progresso em direcção a mais ciência, a mais consciência e objectividade, e que tudo isso não passe de um discurso de intelectuais e de ideólogos a quem desde há três séculos tem proporcionado um benefício considerável?"

"O crime perfeito" (Jean Baudrillard)



O Iluminismo terá sido esse discurso sobre o real e o racional que engendrou a ideia moderna do progresso que a crítica do século XX demoliu. Pode fazer-se um balanço deste século sem considerar que, apesar de todas as conquistas da ciência, pelas suas guerras e as suas distopias, representou sobretudo o choque duma realidade não racional, desintegradora de qualquer ideia de progresso?

O profetismo de Nietzsche encontrou nesse século uma fácil verificação. O profeta do anti-humanismo anuncia um novo mito, o do super-homem que mais não é do que o regresso ao 'natural' e ao domínio das forças.

Enfim, a partir da ruína do pensamento e das cidades, ressurgiu a ilusão com todos os atributos da adaptação darwinista. A pergunta de Baudrillard leva-nos a inquirir sob que forma voltaram o real e o racional. E talvez se possa dizer que o real faz parte da ilusão sob a forma da incerteza. A razão foi 'redimensionada' em conformidade. Só os economistas acreditam ainda que o racional é real.

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