"O que chocava em todos estes fenómenos, era uma certa tendência para a alegoria, se se entender por isso uma relação intelectual em que todas as coisas adquirem mais significações do que aquelas que honestamente lhes cabem."
"O Homem Sem Qualidades" (Robert Musil)
Esta ideia tem imensas aplicações, porque na política, por exemplo, toda a gente abusará, então, da alegoria.
Em primeiro lugar, porque a função traz um suplemento de 'significações' ao estreante que este ainda não mereceu, mas que não choca ninguém por causa do que se convencionou chamar de 'benefício da dúvida' ou 'estado de graça'. Veja-se o caso de Passos Coelho a quem uma certa pose e colocação de voz serviram num primeiro momento, a ponto de ocultarem o que mais tarde se tornou notório: a sua formação 'aparelhística' e a falta duma verdadeira experiência política.
A 'alegoria' é, neste caso, a promoção ao nível histórico e patriótico da visão dum partido de 'tenores', cada um virado para a sua plateia, sem uma ideia que se possa dizer representar a realidade 'não alegórica' dum eleitorado flutuante que a actual 'aterragem' de emergência da classe média ameaça extremizar. Deve-se acrescentar àquela visão a atracção exercida em PPC pela cartilha falida de Milton Friedman. Isso permite-lhe cumprir o programa da 'Doutrina do Choque' e ao mesmo tempo 'salvar' o país das consequências da gestão socialista. Lembramos que a 'Doutrina do Choque' (Naomi Klein) é o aproveitamento (ou a provocação) da catástrofe natural (Katrina) ou da crise económico-social para implementar as mudanças que a doutrina prescreve, mas que a democracia torna inviáveis.
Está, porém, cada vez mais à vista, que se tivermos a catástrofe e a mudança, será apenas em benefício de alguns (os mesmos) e em prejuízo da democracia.
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