“A inconsistência sempre foi o calcanhar de Aquiles do pensamento liberal; que combina uma confiança inabalável no Progresso, com uma não menos estrita recusa em glorificar a História, em termos marxistas e hegelianos, sendo que só esta poderia justificar e garantir aquele.”
Hannah Arendt ("On violence")
O papel da teoria nas nossas vidas é geralmente desconsiderado. Mas é a passagem dum simples preconceito a uma teoria, mesmo incipiente, que frequentemente endurece as posições e faz com que algumas leis razoáveis não tenham qualquer viabilidade prática.
A ideia do Progresso é, no fundo, a crença em que o desenvolvimento natural das actuais potencialidades da sociedade humana, se não entravarmos o seu curso espontâneo, é essencialmente bom para a Humanidade.
Um dos pais do liberalismo económico, Adam Smith, acreditava no Progresso, sob a forma da célebre Mão Invisível que, no final de contas, transformava os vícios privados em virtudes públicas.
Tal optimismo foi, posteriormente, várias vezes desmentido pela realidade, levando a que os Estados, muitas vezes, tivessem que ajudar a Mão Invisível. De facto, a ideia do Progresso não está alicerçada em nada, a não ser no prodigioso desenvolvimento das ciências naturais, a partir do século XVI, e das suas aplicações técnicas, as quais, por outro lado, tornaram o planeta cada vez mais vulnerável. Isto é, marcaram um prazo para o Progresso, tal como tem vindo a ocorrer, ao fim do qual só nos resta desaparecer ou voltar atrás, se for ainda possível.
A inconsistência de que fala Hannah Arendt, a propósito daqueles que confiam no livre jogo das forças em presença (mesmo quando concedem nalguns amortecedores) é também o fruto, ainda mal digerido, da terrível experiência, no século XX, do Estado totalitário.
Mas quando a experiência nos leva a incorrer no erro contrário, não é uma experiência, é um espantalho.
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