terça-feira, 22 de outubro de 2013

QUESTÕES DE ESTILO

"Numa entrevista completamente autocentrada, e construída sobre a imagem do líder decidido e inabalável ("nunca me fui abaixo"), aquilo que sobressai, como uma obsessão, é o action man que só caiu porque foi traído e só não salvou o país porque não o deixaram. Que Sócrates pense isso de si próprio, não chega a espantar - como canta Caetano, "Narciso acha feio o que não é espelho". O que espanta é ele continuar a ter uma vasta corte de fiéis, que certamente não o seguem por causa das suas ideias (quais são?), mas sim porque continuam fascinados com o seu estilo enérgico, desbocado e autoritário."

(João Miguel Tavares no 'Público')

O ódio a José Sócrates reparte-se bem entre a direita e a 'verdadeira' esquerda. Gostava de pôr ao contrário a questão levantada por JMT.

Não há dúvida que quaisquer que tenham sido os erros da sua governação, e qualquer que tenha sido a justificação da campanha que lhe foi incansavelmente movida, enquanto foi primeiro-ministro, outros vieram a seguir, com muita vontade de fazer, que tanto ou tão pouco fizeram que, em comparação, o Narciso de JMT merecia um juízo mais equitativo. É, pelo menos, o que diz o ditado: "Atrás de mim virá quem de mim bom fará."

Mas não. A 'ferida' continua aberta. E, me parece, que mais depressa Passos teria direito a uma segunda oportunidade do que Sócrates.

Ora, se não nos devemos deixar enganar pela arte do ex-primeiro-ministro (tudo parece pensado para produzir um efeito mediático, para, neste caso, 'reconstruir' uma imagem vandalizada), tampouco temos motivo para nos surpreendermos. Trata-se de legítima defesa (outros não esperariam por ter cumprido a sua 'travessia do deserto'). A Direita construiu nos media a horrenda quimera que é para tanta gente a figura de José Sócrates. Com "o seu estilo enérgico, desbocado e autoritário", não podíamos esperar que ele não espreitasse a sua oportunidade.

Mas voltemos ao fascínio, não dos que apoiam o homem, mas daqueles que querem fazer passar a imagem do político execrável que as sucessivas campanhas fizeram dele. Providencial culpado para os coveiros da nação, que, apesar de tudo o que aconteceu depois, mantêm a sua vela acesa a um demónio que 'veste Prada', 'playboy' e verdadeiro 'macho político', nas palavras do jornalista. É curioso que JMT pergunte pelas ideias de Sócrates. Mas a verdade é que nem com uma lanterna as encontraremos na política portuguesa (ou têm século e meio). José Sócrates, por desgraça, não é diferente, e está muito bem acompanhado por essa Europa fora.

Para concluir, talvez o entrevistado de Clara Ferreira Alves tenha acertado na 'mouche', quando disse: "Eu sou o chefe democrático que a direita sempre quis ter." Desdenham-no porque o querem comprar"?

Isso explicaria tambėm por que é que esse estilo causa tanta urticária a uma certa esquerda.

Mas, ao dizê-lo, é bem verdade que ficamos sem saber no que realmente pensa José Sócrates.

 

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