"Estamos tão desesperados por encontrar uma maneira de controlar os terrores que nos assaltam, que inventámos a culpa como a pedra de toque de uma explicação."
(Susan Nieman, comentando Freud)
Precisamos de compreender a nossa situação (e para isso qualquer narrativa serve), de modo a "mantermos os pés no chão'', ou em terra firme.
É esse o poder dos mitos e das histórias, da poesia e dos adágios populares. Se não pudéssemos contar o que nos acontece, não haveria sequer memória, nem os outros andares do edifício humano.
A razão só funciona nessa 'terra firme'. A geometria precisa do espaço que criamos com a cultura. Só há cerca de seiscentos anos 'descobrimos' a perspectiva. Essa solução não fez falta aos Antigos para produzir a sua maravilhosa arquitectura. Ela correspondeu a uma outra representação do mundo.
Mas porquê a culpa? Nieman, continuando a citar as ideias do fundador da psicanálise, diz a seguir que "o homem primitivo bate no seu fetiche quando lhe sucede uma desgraça; o homem civilizado bate em si próprio."
"Bater no fetiche" não mudava o mundo, mas era também a identificação duma causa imaginária. Bater em nós mesmos, ou encontrar em nós essa causa, é a fonte dum dinamismo revolucionário.
Atribuir a culpa a nós ou aos outros é o que faz funcionar o mundo. E tudo passa por uma narrativa, como disse Sócrates, o Menor.
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