sábado, 9 de fevereiro de 2013

O ESCRITOR LIBERTINO

 




"O falo, neste século, torna-se doutrinário."

Henri Michaux



Haverá um imaginário como o do grande Federico?


Talvez ele, de facto, tenha sido atraído pelo seu contrário, ao dedicar um filme a Giacomo Casanova, um homem que em vez de sonhar, realizava. Um homem, pois, sem imaginário.


Do alto do seu 1,91 m, seguro de si e da sua boa estrela, com talentos que iam muito para além da arte da sedução (ou da comparação de forças?) que lhe granjeou a fama, visto que se reclamava de filósofo, alquimista e até de saber de economia (tinha um processo infalível de aumentar a receita dos estados, sem recorrer aos impostos...), está por isso nos antípodas da personagem de Marcello Mastroiani, no "Oito e meio", perdido diante da sua folha em branco.


Quanto à mulheres, realmente, nunca chegou a conhecê-las. Todas foram um desafio à sua virilidade, condenando-se a uma sexualidade mecânica, sintetizada no sonho final dum bailado imóvel de duas marionetas.


O veneziano não conhecerá, assim, o medo metafísico do homem atraído à cidade das mulheres.

A cena do mimo em casa do corcunda Dubois, em que este metamorfoseado numa espécie de louva-a-deus acaba com o amante à dentada, ataca o centro desta sexualidade engrenada na funcionalidade paranóica.

Não se compreenderiam estas aventuras através da Europa, com a sua galeria de monstros femininos, sem a produtividade da escrita.


É verdade que não se pode escrever o amor, mas a ária do catálogo é a prova de que se pode (tem de?) escrever o seu fracasso, de conquista em conquista.


Casanova nas Memórias alçou-se à altura dum Príapo doutrinário, antecipando, assim, o nosso século.

0 comentários: