O herói da Ilíada é Aquiles, mas na maioria do poema está ausente, longe da cena, junto às naus dos Mirmidões, no mais celebrado amuo de toda a literatura.
A guerra só poderá decidir-se a favor dos Gregos se Aquiles se vencer a si mesmo e voltar aos combates.
"Como se sabe a Ilíada tem vinte e quatro cantos. Durante os primeiros dezoito, Aquiles continua amuado em consequência da desconsideração de que foi alvo no Canto I e recusa-se a combater. É o herói bélico por excelência , mas podemos ler oitenta por cento da Ilíada sem que ele pegue numa única arma." (Frederico Lourenço)
Esta espera é pois um longo "suspense" (técnica que, como se vê, não foi descoberta por Hitchcock).
Se pensarmos, porém, que o regresso do herói significa também o fim da sua curta vida, pois que a seta de Páris o ferirá no seu único ponto vulnerável, o deferimento é motivado por muito mais do que uma paixão irracional.
Porque é uma boa imagem do amor à vida, quando se sabe que o cálice não pode ser recusado por muito tempo.
E o calcanhar, por onde o segurou Tétis, em criança, para o mergulhar nas águas do Estige, um dos rios do Inferno, é o sinal da impotência e da imprevidência dos deuses, da Lei a que mesmo eles têm de obedecer.
Nada disto é abstracto, como a ideia da perfeição, da ubiquidade ou dum ser todo-poderoso.
A teogonia é um teatro nas núvens para edificação dos mortais.
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