"Nenhum homem está tão provido de justiça que não lhe seja necessária a tentação da inquietação ('tentatio tribulationis': que o homem se converta num problema para si mesmo").
(Santo Agostinho, citado por H. Arendt)
Este pensamento vai ao encontro do aforismo evangélico que nos 'condena' a 'pecar, não sete, mas setenta vezes sete'. A justiça aparece assim como um ideal inalcancável (a não ser através da 'graça' que, precisamente, é exterior ao homem. Não podemos ser justos, ponto. Não podemos esquecer-nos de que a nossa existência (a 'carne', do catecismo) nos 'corta as asas' rente. Por isso, do ponto de vista humano, é injusto condenar a figueira que, no Novo Testamento, não deu fruto fora do tempo.
A pedagogia socrático-platónica abria, porém, uma via para a justiça, que é a de começarmos por ser justos dentro de nós mesmos, por estabelecer a paz na guerra civil interna, entre a cabeça, o coração e o ventre. É, de certa maneira, semelhante a resolver, mas não de uma vez por todas, o problema que Agostinho diz que somos para nós mesmos.
Aqui, o santo, abandona a influência grega e a sua solução 'feliz', porque a 'carne' não é simplesmente o problema do homem consigo mesmo. O pecado é outra coisa, é um destino e uma promessa de 'salvação' se...
A 'salvação' é uma ideia que, em tempos mais próximos de nós, incarnou a utopia política. O tempo da justiça para todos é o horizonte da Revolução. O problema de que fala Agostinho seria resolvido por outro tipo de 'graça' emergindo de uma História divinizada.
E perante nós, agora, está o tempo sem culpa (Freud reduzíu-a ao sexo) e do homem não-problemático, porque encontrou uma solução médica, securitária e mágica ao mesmo tempo, a de um condomínio ideal, igualitário e, finalmente justo ( ou ajustado) dentro dos seus muros cegos.
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