"To be or not to be" |
A realidade é, como disse René Char, esse "calmo bloco aqui em baixo, caído de um desastre obscuro". Temos de lhe dar um sentido que abra um espaço para nós, humanos. Coisas como a economia e a ciência só são possíveis na medida em que podemos contar com aquela 'calma'. Isto é, enquanto pudermos confiar nas leis que encontramos em nós mesmos.
Karl Gerhard foi o antigo médico de Himmler e quando o informaram sobre o campo de Dachau, encontrou isto para dizer: "Lamento que a injustiça seja ainda deste mundo". Podia ficar em silêncio, mas aquela resposta é claríssima: o que se tinha passado nos campos de extermínio não era nada com ele. Acreditava, talvez, na ficção de uma justiça automática que surgisse no mundo por obra e graça de alguma entidade superior.
O Estado providencial vem-nos logo à cabeça, porque é o que fica depois da retirada dos deuses. Quando se lhe entrega a alma é a abdicação total, por maior que seja o zelo e a militância com que nos empenhemos.
Lubitsch, em "To be or not to be", mostra o orgulho do funcionário a quem o impostor (Jack Benny) chama de 'concentration camp Ehrhardt'. Um título mais anestesiante não era possível num mundo às avessas.
O mundo do sentido percorre estranhos caminhos.
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