domingo, 3 de maio de 2015

O FALSO PROFUNDO

 

"No seu segundo regresso, nomeado tenente-general e de novo tornado marquês, o senhor d'Aiglemont teve a ambição de chegar ao pariato, adoptou as máximas e a política do Conservador, envolveu-se de uma dissimulação que nada escondia, tornou-se grave, interrogador, de poucas palavras, e foi tomado por um homem profundo."

"La femme de trente ans" (Honoré de Balzac)

D'Aiglement, que serviu no exército napoleónico e depois aderiu à restauração dos Bourbons, acompanhando o rei no breve exílio de Gand, foi devidamente recompensado.

Como certa personagem de Eça, uma nulidade, passou por um homem profundo por nunca expressar um pensamento. Baudelaire dizia à mulher bela que se limitasse a sê-lo e que se calasse ("sois belle et tais-toi").

Não é o silêncio que acrescenta à inteligência ou à beleza. É a ilusão que é possível manter, até prova em contrário. Sabe-se como esse crédito é necessário aos jovens para poderem aprender. A humildade não obtém os mesmos resultados do que aquela ilusão. Quem ensina não se deve deixar desencorajar por uma resposta naturalmente inepta. E quanto maior for a esperança, menos ela importa, de facto.

Quanto à beleza, é verdade que a tolice a desfeia mais do que qualquer outra coisa. Como aquela cena, na "Serenata à chuva", quando se dá a passagem para o sonoro, em que a "diva' começa a falar com a sua própria voz, e não com aquela que o público sempre imaginou.

O tenente-general de Balzac teve ao menos a inteligência de reconhecer que era tolo e que convinha à sua ambição esconder esse defeito dos outros.

 

 

 

 

 

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