quarta-feira, 18 de março de 2015

OSTRAS E CARACÓIS

Kirk Douglas e Stanley Kubrick

 

Em "Spartacus" (1960-Stanley Kubrick), Crassus (um soberbo Laurence Olivier) e Antonino (Tony Curtis).

A atmosfera do banho, a penumbra e o tom carnal das cores são o quadro duma tentativa de sedução da alma (o corpo do escravo não é problemático), que começa por uma teoria sobre ostras e caracóis, debitada pelo patrício.

Depois de estabelecer que entre os dois comestíveis não pode haver uma escolha moral, mas apenas de gosto, acrescenta que ele, Crassus, aprecia ambos. Deste subentendido sexual, volta-se para a silhueta da cidade, exaltando-lhe o poder irresistível, em erecção simbólica, como a personificação desse poder. É quando o escravo, aproveitando a alucinação erótica do romano, foge desse abraço mortal, para se ir juntar a Espártaco.

Esta cena, que contribui, com as da paixão por Varínia, a mulher do rebelde, para humanizar o político ambicioso é um exemplo do feliz efeito da norma desafiada e contornada pela imaginação criadora.

A norma, hoje, seria "pôr o nome aos bois" e lidar com uma homossexualidade sem interditos. A resistência ideológica funciona aqui como a do material que impede as formas abstractas e pré-concebidas de terem sucesso. Podia-se dizer que quanto mais "preciosa" e arbitrária for a censura, mais a expressão do censurado se pode salvar apenas pela originalidade.

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