quarta-feira, 25 de março de 2015

O RISO DO ESQUELETO

http://www.abroadintheyard.com/wp-content/uploads/The-skeleton-of-Richard-III.jpg

 

"Anedota (suponho que imaginária), na Rússia: Estaline teria ordenado a Krupskaïa para cessar toda a crítica, sem o que designaria uma 'outra viúva' de Lenine."
(Albert Camus)

Imaginária, mas muito lógica. E com o chiste de ridicularizar o abuso do poder. Quando aperfeiçoada pela prática repetida, a 'imagem' pública funciona quase independentemente do indivíduo. É uma sua extensão com vida própria, como uma personagem fictícia agindo na realidade e fora dela. Suponho que o mito é isso. A verdade de Estaline, a sua vida, perdem-se entre as memórias 'para a posteridade' e a biografia oficial.

Julgamos saber que ele era capaz das maiores atrocidades (mesmo se o braço do poder fosse mais curto): mas é razoável pensar que temia o ridículo. O 'homem de aço' tem pouco jogo de cintura, e mudar a viúva seria mais próprio do rei Ubu. Não é como mudar uma fotografia (compreendemos isso muito bem, na era do Photoshop).

Há só uma espécie de riso permitido na corte do poder absoluto: o riso infernal do esqueleto.

Anedotas como esta podem não traduzir os factos, mas são justas. Esta, além disso, é de certo modo consoladora. Marca o limite do poder. A vítima que pudesse rir por dentro desintegraria o seu algoz.

 

 

0 comentários: