"No seu segundo regresso, nomeado tenente-general e de novo marquês, o senhor d'Aiglemont teve a ambição de alcançar o pariato, adoptou as máximas e a política do 'Conservador', cobriu-se de uma dissimulação que nada escondia, tornou-se grave, interrogador, pouco falador, e foi tomado por um homem profundo. Se, por acaso, ficava despreocupado ou mais alegre como era antes, a insignificância e a ingenuidade das suas considerações tinham para os outros subentendidos diplomáticos."
"La femme de trente ans" (Balzac)
O nosso Eça deverá alguma coisa a esta personagem balzaquiana tantas são as nulidades, como o conselheiro Acácio, que passam por homens profundos nos seus romances.
A diplomacia é uma arte de dissimulação como se diz. Uma dissimulação que toda a gente espera, levando a que as palavras ditas pareçam estar sempre em lugar de outras, que seriam as verdadeiras. E, como no teatro, a palavra dita não pode ser retirada e é parte do desencadeamento da intriga.
O poder (político ou social) de que estão investidos protege o diplomata e o tolo disfarçado de homem profundo de não serem levados a sério. O lugar que ocupam impede-os de cairem na insignificância ou no ridículo.
O filme de Hal Ashby "Being There" (1979) é uma parábola sobre a falsa sabedoria. Chance, um velho jardineiro, um pouco tolo, fica sozinho na casa do patrão depois deste morrer, e ninguém sabe o que fazer com ele, até que um acaso o leva a conhecer um velho milionário com influência sobre o inquilino da Casa Branca. Treslendo a linguagem prática de Chance sobre o único mundo que conhecia: o seu jardim, o milionário descobre no seu protegido um visionário de profunda sabedoria e apresenta-o ao presidente dos EUA. O 'qui pro quo' é levado até ao fim, com o governo do país convertido à metáfora jardinística que aquele grupo fez das palavras de um retardado mental.
Não é bem como o apólogo do 'Rei vai nu', em que uma criança pode libertar a multidão de representar uma comédia. É a estupidez servil e contagiante dos que imitam os seus superiores.
0 comentários:
Enviar um comentário