sexta-feira, 12 de junho de 2015

A GRANDE FICÇÃO






"Temos de distinguir entre ficção e ideologia. Porque genericamente falando a ideologia é qualquer coisa que não está associada com a ciência, ou com a verdade, ou com o real, com a realidade. Mas como nós sabemos desde Lacan e antes dele, a própria verdade é uma estrutura de ficção. O processo da verdade é também o processo de uma nova ficção. E assim encontrar a grande ficção é a possibilidade de encontrar uma fé final, uma fé política."

(Alain Badiou, conferência no Birkbeck Institute for the Humanities, Londres, em 26/11/2005, transcrição de Robin Mackay)

Mas pode acreditar-se nos mitos? Jean-Pierre Vernant  fazia essa pergunta em relação aos Gregos. Teriam eles a fé dos 'fiéis'  do Cristianismo, por exemplo? A ironia de um Aristófanes ou a política de um Platão não são realmente representativos da atitude comum. Nesse tempo, levava-se tão a sério o culto dos deuses que Sócrates foi condenado à morte por querer introduzir 'novos deuses' (como a consciência no sentido moderno) na cidade.

Por outro lado, temos a opção do jornalista pela lenda contra os factos no filme de John Ford, 'O Homem que matou Liberty Valance'. 

A palavra 'narrativa' entrou recentemente no nosso vocabulário político. Talvez seja o sinal de que a crise política, o desencanto geral em relação à política e à democracia, tenham sobretudo a ver com a redução da política à ideologia, com o triunfo dos economistas e dos saldos de balanço.

Nesse sentido, a 'grande ficção' de que fala Badiou é outro nome para as ilusões 'eficientes' conotadas com a juventude dos homens e das nações. O filósofo, como o ancião, acabam por ter razão contra eles mesmos, porque o melhor que fizeram na vida não foi fruto de análise nem de dissecação.

Quem pode devolver-nos o estado de graça senão um novo mito criador?

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