"Do mesmo modo, sustentar que o verdadeiro “milagre” de Fátima não está nas visões dos pastorinhos e nos gestos da “mulher vestida de branco” mas no facto de, contra todas as expectativas, aquele lugar se ter imposto à Igreja e ao mundo não é uma forma sustentável, ou aceitável, de lidar com uma realidade que a todos interpela, crentes e não-crentes."
"Fátima, cem anos depois" (António Araújo, in 'Público' de12/2/2017)
A parte mais 'fraca' das aparições, a auto-sugestão ou sugestão de outros, atendendo ao contexto da época, revela-se simultâneamente o que dá mais força à sua história; porque parece evidente que essa história era 'esperada' e 'desejada e que só podia ser transmitida pelo mais inocente, ou os mais inocentes dos mensageiros: os anjos e as crianças.
A visão interior, ou ali 'implantada' pelo meio, só interessa na medida em que é preservada a inocência que deixa passar a ideia, como um condutor neutro é atravessado pela corrente. Nesse sentido, os acontecimentos da Cova da Iria são a 'produção colectiva' em meio rural de um 'mistério', uma celebração que entronca na manifestação tradional da religiosidade popular.
A pergunta final do articulista põe o acento no respeito que nos devem merecer todas as crenças, dúvidas e descrenças igualmente sinceras. Aqui, já estamos completamente fora do que faz a originalidade de Fátima.
"Mas, acima de tudo, o Santuário recebe anualmente milhões de cidadãos anónimos, que aí vão pelos mais diversos motivos. Por razões íntimas, pessoalíssimas, que a cada qual dizem respeito, e como tal, devem merecer o respeito de todos. Mesmo dos que não crêem em Deus ou não são católicos; ou dos que, sendo-o, não acreditam nas aparições de Fátima e na sua mensagem. Mas não será o respeito pelos outros, crentes e não-crentes, a principal mensagem de Fátima e o seu maior desígnio?"
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