"A arte e nada mais do que a arte; temos a arte a fim de não morrermos da verdade."
(Friedrich Nietzsche)
Este aforismo ainda diz muito ao nosso tempo. Mas não saberíamos que valor atribuir à arte se não fosse o mercado a dizê-lo. É a sua prova de contrastaria. Nesse sentido, a arte ter-se-ia tornado o principal adereço da câmara funerária, para nos acompanhar na vida eterna em outro Vale dos Reis. Seria o significado de tantas fundações de 'mundanos' convertidos em artigo de morte (se nos conseguirmos libertar da explicação mais cínica, a de dourar/ branquear o nome e ganhar nos impostos dinásticos).
Mas o filósofo das grandes blasfémias descarta essas minudências. A velha dicotomia entre o corpo e o espírito não estorva a sua imaginação. Ele, que nos últimos anos de vida, 'somatizou' para grande escândalo do 'espírito', tornando-se o símbolo do desvario sem perdão. O génio humilhado apontado aos caminhantes nas encruzilhadas, como lição de pensar segundo as normas consagradas, as academias ou o simples 'bom senso'.
Diz Carlos Vidal ('Invisualidade da pintura') que "a verdade é uma irrupção de uma novidade fortuita que se subtrai ao conhecimento (...), à comunicação, à opinião e, sobretudo à experiência."
Desde que nos tornemos incapazes de acreditar na Ideia platónica ou cristã e no emprendimento salvífico da revelação, a verdade perde a perspectiva das perspectivas; tem de abandonar a sua plataforma no espaço exterior ou interior; tornar-se irrupção da novidade 'fortuita', tornar-se acontecimento.
Em que é que Nietzsche foi o profeta deste 'estado da arte'? E que ameaça viu ele na verdade e arte separadas? Será a arte a 'prótese' por excelência que nos permite ver sem realmente ver? Dar sentido a um mundo que não pode ser 'lógico', nem 'material'? Sentido que se aprende à margem das evidências do corpo-espírito?
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