Christine Garnier e Salazar |
Christine Garnier, a jornalista francesa que, nos anos cinquenta, veio a Portugal entrevistar Salazar e que, com ele, teve um suave 'affair', registou esta confissão do ditador: "Não creio no destino [...]. Creio na Providência. É ela que, há tantos anos, me força a um labor contrário aos meus gostos."(*)
Não temos razão nenhuma para duvidar de ser essa a convicção de Salazar. A riqueza não era certamente a sua motivação, ele que acabou os seus dias dependente de um decreto para ter alguns meios de sobrevivência. Quanto ao poder, é outra coisa. Mas qual o ambicioso que, finalmente tendo alcançado o 'poder absoluto', descuraria assim a sua velhice, o seu próprio e legítimo interesse?
As suas origens, a sua formação católica (mas a sua relação com a Igreja não foi de obediência, apesar da sua conhecida amizade com Cerejeira, uma amizade distorcida pela política), explicarão, talvez, aquele alegado 'espírito de missão' e a ideia que ele se fazia de si próprio de ser o homem certo na hora certa. Daí a degenerar esse sentimento para a ideia de ser insubstituível foi o declive natural.
Esse deslize progressivo do poder para a paranóia é perfeitamente compatível com a sinceridade da sua confissão a Garnier. Quanto mais o 'labor' político o afasta dos seus gostos, pretensamente preteridos, mais a situação se aproxima do masoquismo.
Quanto ao destino, não é uma ideia moderna fora da canção nacional. Tem de haver lugar para a acção, real ou ilusória. Por isso, a Providência, que nos deixa perambular, mas sempre na boa direcção.
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