quinta-feira, 3 de julho de 2014

A REPETIÇÃO

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"'Viveis tempos interessantes', disse Paul Valéry a uma plateia de universitários de Paris, no dia 31 de Julho de 1932. 'Os tempos interessantes são sempre tempos enigmáticos que não prometem descanso, nem prosperidade, continuidade nem segurança', e acrescentou: 'Nunca a humanidade juntou tanto poder e tanta desordem, tanta apreensão e tantas diversões, tanto conhecimento e tanta incerteza.'"

"História do Século XX" (Martin Gilbert)

No presente século, o sentimento de Valéry continua mais do que actual. Parece, agora, haver uma outra actualidade derivada de estar ainda tão próxima de nós a ultrapassagem de um limite para a humanidade. Passada essa fronteira, nada pode ser como antes.

A coexistência do poder e da desordem, da apreensão e do divertimento de que falou o poeta assenta, hoje, no 'recalcamento' da experiência traumática do século XX, da sua camuflagem, ou da traição do seu significado por uma linguagem 'objectivante', que põe o acontecimento à distância e o transforma em 'facto histórico'.

A 'hiper-actualidade' das palavras valerianas resulta deste passado 'insepulto' que assombra o nosso pensamento e o nosso discurso.

Enfim, para voltar à terminologia da psicanálise, no centro deste tempo 'enigmático' está doravante instalada a neurose, e nem nos damos conta de como estamos, tragicamente, a repetir a história, sem aquele aspecto de farsa que Marx via na repetição.

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