"Há só duas classes de seres: os magnânimos e os outros; e eu cheguei a uma idade em que é preciso tomar partido, decidir de uma vez por todas quem se quer amar e quem se quer desdenhar, prender-se àqueles que amamos e, para reparar o tempo que desperdiçámos com os outros, não mais os deixar até à sua morte."
(Marcel Proust, citado por Yves Simon in "Les éternelles")
Não sabemos se Marcel cumpriu, ou teve tempo para cumprir um tal programa. Agostinelli, por exemplo, que terá inspirado a personagem de Albertine, desapareceu nas águas de Antibes mais o avião que pilotava.
Como essa 'ligação' ressoou por toda a catedral da "Recherche", pode dizer-se que o autor manteve o partido do amor (expressão stendhaliana) para além da morte do ser que o inspirou. 'Em busca do tempo perdido' é mesmo um romance de perdição. O ciúme serpenteia ao longo de páginas sumptuosas, mas em que se tornaria a meditação do início se fosse só isso? O partido tomado teve, afinal, o destino de Ícaro (e não haverá aqui uma alusão ao desastre?). Como as asas de cera inventadas por Dédalo para o filho, o ideal do amor para Marcel estava prometido às chamas do ciúme, já que a pessoa amada se tinha substituído ao mundo.
Conhecida a vida do romancista, apetece dizer que aquele desastre de avião se consumou e sublimou na escrita proustiana. E o romance explica todo o monumento humano.
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