"(Uma personagem feminina: "Nós não amamos, só fingimos.") - Oh sim, são palavras que eu sinto...ou melhor, não são o que eu sinto, são o que eu conheço. O amor é uma memória que nos foi transmitida, uma lição recitada. O amor é só uma forma de piedade por nós próprios. A consciência de que fomos privados de alguma coisa."
(Entrevista de Agustina Bessa-Luís a Clara Ferreira Alves )
Quando essa 'memória' toma posse do ser atinge-se o equivalente do êxtase de Santa Teresa, da união 'nupcial', em que já não é possível distinguir a criatura do amor do seu deus. Como deveríamos chamar a este instinto ou a esta 'lição recitada' que suprime de um modo tão radical a consciência infeliz, privada, como diz Agustina, de qualquer coisa?
As provas de que essa memória nunca deixou de ser alimentada, transformada, adaptada são esmagadoras. As instituições, as artes e a literatura, e até a indústria especializada não cessam de renovar a memória do amor. Na trilogia de Pasolini há mesmo uma cena em que uma rápida troca de olhos, entre os amantes decepados e por fim decapitados, em que a 'memória' não é mais do que uma faísca negando o abandono e as trevas cadentes.
Por fim, o cepticismo da grande escritora resulta de facto de um conhecimento? É de novo uma discussão sobre a natureza da matéria.
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