domingo, 11 de setembro de 2011

O BANHO DE MULTIDÃO

Elias Canetti (1905/1994)


“Penso que o ser humano individual se sente ameaçado pelos outros e experimenta por esta razão alguma ansiedade em relação a ser tocado por qualquer coisa de desconhecido, e que ele se procura proteger por todos os meios do desconhecido criando distâncias à sua volta, esforçando-se por não entrar em contacto demasiado próximo com os outros seres humanos. Todos os seres humanos experimentam isto, que se tenta não empurrar os outros, e que não se gosta de ser empurrado pelos outros. Apesar de todas as medidas preventivas, os seres humanos nunca perdem completamente o medo de serem tocados. O que é notável é que este medo desaparece completamente numa multidão. É um paradoxo realmente importante.”


Elias Canetti (Discussion with Theodor W. Adorno)



A explicação de Canetti para este paradoxo é que todos sentimos um enorme alívio ao nos libertarmos daquele medo imergindo numa multidão. E é, talvez, como o medo do frio, antes de mergulharmos na água do mar.

O certo é que essa imersão produz em nós um estado euforizante que, no caso das massas de gente, se multiplica provocando uma tensão que precisa de encontrar um exutório, seja ele o grito em uníssono ou o movimento caudaloso pelas ruas mais próximas.

A multidão, além disso, ao fazer-nos esquecer o nosso sistema defensivo dá-nos uma sensação enganosa de força extraordinária.

Canetti utiliza a ideia de multidão invisível, de origem provavelmente religiosa, e cita o caso de Richelin, um abade cisterciense da Idade Média que se sentia rodeado duma poeira espessa de demónios, comparando esse medo e essa legião invisível com o que sentimos em relação aos bacilos e a toda a espécie de vírus ou micróbios…

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