quinta-feira, 20 de outubro de 2011

FADÁRIO

(Estação do Rossio, Lima de Freitas)



"A única coisa que importa, como em todo o pessimismo bem compreendido, é ter encontrado o elemento inelutável sobre o qual repousar."


"O Homem Sem Qualidades"
(Robert Musil)




Ora se há povo que tenha os ingredientes de cultura necessários para ser fatalista ("o elemento inelutável"), é bem o português, ou a canção nacional não se chamasse fado.

O "fado" exprime-se de diversas formas. É o "é tudo uma cambada", que não distingue o " trigo do joio", a "choldra" queirosiana e são, mais recentemente, os vícios do "portuguesinho" ( assim mesmo, com o diminutivo queremos reduzir-nos à porçāo côngrua e fazer um paralelismo "inelutável" com o tamanho do país): como fomos atrás da sereia do euro e do crédito fácil, "vivemos agora acima das nossas possibilidades" e há que sofrer os trabalhos do serralheiro que fará encolher a cama em que nos deitamos, qualquer que seja o tamanho do corpo. Já estamos a pôr as pernas a jeito para serem cortadas e caberem neste leito de Procusta forjado pela finança do desespero.

Somos pessimistas sim senhor, e desde, pelo menos, a morte do Príncipe Perfeito. Mas, coisa de surpreender, isso não nos torna menos amáveis. Descarregamos como podemos e fazemos boa cara. Sabemos "desenrascar-nos" com o nosso fatalismo todo e manter a cabeça fora da água. Podeis estar certos de que o Estado não nos merecerá mais lealdade depois de mandar vir o "serralheiro" e de deixar impunes os poucos, mas que são a tristíssima elite deste país, que abriram os odres da tempestade (falo só das causas internas). O mercado paralelo florescerá como nunca se viu, e com a cumplicidade da mesma maioria intratável.

Temos muito a ver com os gregos e, com razão, se Ulisses entrou pelo "mar da palha". E estamos hoje nos mesmos apuros, porque, lá bem no findo, acreditamos no destino com o hemisfério esquerdo, e com o direito não. Ou pode ser ao contrário.

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