domingo, 25 de setembro de 2016

O PRÍNCIPE




Luchino Visconti (1906/1976)


Visconti não confiava no talento do actor. Queria que fosse exacto. 

Como no caso da decoração do palácio Ponteleone, de "Il Gattopardo", em que os pratos deviam sair da cozinha a fumegar e as flores, trazidas todas os dias, de avião, de San Remo, tinham de ser frescas, o actor tinha de ser autêntico. O corpo não podia simplesmente representar. 

Um dia, Visconti convocou Renato Salvatore para se maquilhar às 7 da manhã e fê-lo esperar até às 8 da tarde. Obteve o estado de exasperação que precisava para a cena de "Rocco". 

No ensaio da célebre cena do baile, Burt Lancaster não foi mais bem tratado. Doía-lhe o joelho e a cena ia mal. Quando Luchino se apercebeu, pôs-se aos berros e disse-lhe que "não era nada consigo essa história de "divo" (Burt era uma star no seu zénite) e da entorse que tinha arranjado só porque ainda tinha a pretensão de se armar em jovem desportista." 

("Luchino Visconti, Les Feux de la passsion" de Laurence Schifano) 

Veja-se o que o cineasta diz de si próprio: 

"(...) Os actores mais inteligentes compreenderam por que é que eu queria em cena coisas verdadeiras, precisas, exactas. Criou-se a meu respeito uma lenda, a do encenador insaciável, terror dos empresários e dos directores de teatro. Existe sobre o cuidado que tenho na montagem dum espectáculo, uma montanha de anedotas divertidas, mas falsas." (ibidem) 

Bem vistas as coisas, esta obsessão em imitar a vida é muito pouco teatral e a maior parte do cinema corre noutra direcção.

Mas isso é o que cada criador traz à arte: o que não existia antes dele.

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