sexta-feira, 4 de abril de 2008

TELEMOVELMAQUIA



A imprensa, a propósito da luta pelo telemóvel que andou na Internet e na televisão, tem evocado outras peripécias de violência nas escolas, desde o fundo dos tempos.

Mas a escola está diferente e tudo o resto, a família já não é a mesma, nem as mentalidades, que dos mais jovens aos menos jovens, não interiorizam já a antiga hierarquia de valores. Não há pai severo que chegue, nem pátria, nem sequer Deus.

A grande mudança não nasceu da revolução social, mas da microeconomia, duma coisa comezinha que afectou a vida de todos: o consumo à medida de cada um, possível, graças à tecnologia. A implosão da hierarquia vem desse grande empreendimento de sedução que é o consumo personalizado. O resultado é que cada pessoa vive mais para si do que para os outros e que os laços sociais, as crenças colectivas enfraqueceram na mesma proporção.

A professora que tentou arrancar o telemóvel da aluna insubordinada infringiu o mais sagrado dos princípios do narcisismo moderno. O direito às coisas pessoais, ao estatuto, ao modo de vida são incondicionais. Não se discutem, como a pátria de Salazar.

A escola está no centro do remoinho. Ela vai contra a tendência geral da cultura que é a busca do prazer, o hedonismo. Para sobreviver, deverá sacrificar os critérios de rigor e as provas de esforço. Poderá, graças ao apoio da lei e a um reforço dos poderes disciplinares voltar a ter a missão que já foi a sua?

Talvez, se for estabelecido na escola um mundo à parte, como um claustro, com um direito especial que a democracia não está preparada para aceitar. Mas resta-nos a utopia. Se as tendências desagregadoras se cumprirem, é possível que a família, apoiada na tecnologia, substitua a função escolar, com prejuízo embora duma certa socialização.

Nessa altura, porém, seremos ainda mais narcisistas do que somos.

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