terça-feira, 22 de maio de 2012

AUSTEROS, 'MA NON TROPPO'


Quintus Horatius Flaccus (65 AC/ 8 AC)


"quid brevi tortes iaculamur aevo
multa? quid terras alio calentes
sole mutamus? patriae quis exsul
se quoque fugit?"


(Porquê tanta fadiga  em nossas curtas vidas por possuir mais e mais? Por que deixamos o nosso país por climas que aquece um outro sol? Que exílio da pátria permitiu a alguém, ao mesmo tempo, escapar a si mesmo?)

 Horácio


Traduzo assim, livremente, a partir do inglês, e a primeira constatação é que empreguei o dobro das palavras, tal é a concisão do latim clássico. Lapidar é o termo.

A frugalidade elogiada pelo poeta era já uma lembrança no tempo em que escreveu a sua ode. Alguém suspiraria pela simplicidade da república na idade de Augusto, se não se sentisse amargurado pelos novos costumes, não propriamente decadentes, visto que o império durou quase tanto como aquela "idade de ouro"? Mas a virtude espontânea dos antepassados teve de ser prègada pelo "pai da pátria" em que se tornou o primeiro imperador, sobrinho de César.

Acontece que, hoje, a situação de crise pareceria justificar, da parte do poder, uma tal prègação. Mas, em vez disso, o que temos é o discurso da austeridade. Uma austeridade que não se pode prègar como virtude estóica, mas apenas como um purgante, um incómodo temporário para se recuperar a saúde económica. E a razão disto é, evidentemente, que o consumo se tornou um dos deuses da nossa época.

De resto, que sentido teria, na era da tecnologia, a moral de uma pastorícia homérica? Para o bem e para o mal, as nossas "extensões" mcluhanianas fazem parte do que somos. Sem a tecnologia, teríamos, desde logo, de abandonar as cidades...

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