terça-feira, 1 de setembro de 2009

A ASTÚCIA DO MESMO



"(…) não é cada planta peculiarmente adaptada ao terreno e ao clima próprios, de tal maneira que cada país está fornecido daquelas produções que lhe são peculiarmente adequadas? E não são do mesmo modo todas as plantas apropriadas às várias espécies de animais que delas se alimentam?... As várias espécies de animais são, uma vez mais, de mil maneiras adaptadas e formadas para o uso umas das outras. Animais de natureza mais feroz caçam o gado mais manso; peixes de maior tamanho vivem quase inteiramente dos que são mais pequenos; e há alguns pássaros que caçam animais terrestres, outros peixes e outros criaturas da sua própria espécie."

"Discourse on Various Subjects" (Joseph Priestley -1733/1804, citado por Daniel Boorstin, in 'Cleopatra's nose')


O que constituía a prova da Grande Cadeia do Ser e dum plano de Deus, fixado no espaço de uma vez por todas, isto é, a adequação, desde o princípio, de todas as coisas umas às outras, tornou-se um problema de tempo, o problema de saber como é que as coisas chegaram ao ponto em que se encontram.

Como dizia Auguste Comte, primeiro formamos a ideia teológica, que já é uma resposta às principais questões do sentido (como as do quadro de Gauguin: "Donde vimos? Quem somos? Para onde vamos?")

A ideia da harmonia universal é continuamente posta à prova à medida que descemos ao "pormenor", o que é uma consequência da divisão do trabalho científico e parece sobreviver em conceitos como o de simetria e na espécie de beleza da matemática.

Boorstin diz: "O Darwinismo não foi tanto uma revolução, mas um clímax. Entre as chaves para a sua providencial adequação à nova era de mudança acelerada estava a transformação da palavra e da ideia de 'Revolução' que aconteceu quase na mesma altura."

É mais do que certo de que um dia consideraremos a própria ideia de Revolução como relativamente… teológica.

Podia dizer-se que é o próprio evolucionismo que prevê essa circunstância. Mas há uma teoria (o marxismo), igualmente indexada à sua própria superação que sabemos ter falhado.

Porque a crítica só funciona como parte de outro paradigma. Até lá é uma astúcia do Mesmo.

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