segunda-feira, 23 de abril de 2012

HERESIA


"Heresia, derivada do Grego 'airesis': ir pelo seu próprio caminho."

(Karen Armstrong, "The case for God")


O mais popular dos poemas de José Régio, "Cântico Negro", professa, nesse sentido, a vontade herética. E não há individualista que se preze que não diga que "não vai por aí".

A heresia tornou-se, numa cultura individualista como a nossa, na própria 'doxa', na opinião dominante.

Mas este exemplo revela também o grau de descentralização do poder a que chegámos. Não devemos restringir esse processo à organização administrativa do Estado. De facto, já não precisamos todos de crer no mesmo Deus, ou no mesmo ídolo, e a tutela da Igreja ou do Partido, em muitos lugares da terra, é coisa do passado. Heresia ou dissidência são o mesmo sintoma dum poder que não se arrisca a confiar na liberdade da consciência religiosa ou cívica.

Mas, rigorosamente, não se trata de confiar nos indivíduos. Trata-se de dispensar as suas decisões, porque se construiu um sistema que assegura o funcionamento das coisas, ao mesmo tempo que transmite o sentimento de que as decisões individuais é que contam.

Infelizmente, a homeostasia do sistema não nos evita as crises que levam tantos à descrença. Assim, cada vez maior é o número dos que ao lerem a inscrição à entrada que diz: "Que não entre quem não for economista.", escolhem o seu próprio caminho.

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