sexta-feira, 3 de novembro de 2006

O TANDEM


Como disse António Dornelas, ontem na televisão, a UGT nasceu dum acordo entre dois partidos políticos.

Apesar desse nascimento não lhe prometer um grande futuro e de não ser o melhor atestado de independência, nunca a propósito dessa Central se falou em "correia de transmissão", ao contrário da Intersindical que nasceu sem a bênção do poder estabelecido, embora sem a espontaneidade nem a assepsia partidária que alguns puristas desejariam.

Hoje, as duas confederações estão muito diferentes do que foram nesses tempos de paixão colectiva e de grande divisão dos trabalhadores.

E pode dizer-se que o seu parto artificial não marcou o destino da UGT, nem a naturalidade do outro criou qualquer tipo de virtuosa fatalidade na grande concorrente.

Mas cada uma das centrais desenvolveu um estilo inconfundível que, aliás, está bem representado na personalidade do respectivo secretário-geral.

A UGT adopta, normalmente, uma pose de responsabilidade que faz com que muito facilmente se encontre do lado das posições oficiais, ou demonstre maior compreensão em relação a elas.

Podíamos chamar a esta política de realismo, que constata a relação de forças e se adapta à gestão do seu campo de manobra.

Mas é bom de ver que a política não é isto ( a existência do "Grande Animal" platónico será sempre um argumento a favor da imaginação e do "ruído", contra a pura racionalidade) e que o sindicalismo pode morrer desta falta de horizonte, sufocado pelo colete dos factos, da existência, do que tem de ser, da força maior.

A outra central é o contrário de tudo isto.

Irrealista, chegando a propor medidas impraticáveis no actual sistema político e até contraproducentes, sem uma mudança no quadro internacional da nossa economia, voluntariamente ignorando as regras do capitalismo e deixando para a concorrente o bom-senso e os custos de toda a negociação, sempre tem praticado um sindicalismo contestatário.

Com isto, a motivação, a esperança e a utopia ao alcance das massas que influencia.

Tão acentuadas diferenças não nos devem, porém, esconder o facto de se ter objectivamente instaurado uma frutuosa divisão do trabalho dentro do sistema bi-confederativo. A ponto de já não se compreenderem uma sem a outra. Cada central é a caução da outra.

Porque o realismo se auto-censura e acaba por favorecer o status quo, precisa de ter em frente uma força que experimente os limites e exerça uma permanente tensão. E essa força crítica poderá ser tanto mais livre e ligeira, quanto o seu prosaico complemento for prisioneiro das formas e carregar o peso dos compromissos.

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