terça-feira, 19 de janeiro de 2010

RENÚNCIA



"Hoje, eu tenho uma certeza: quando se começa a renunciar às suas exigências e aos seus desejos, pode-se também renunciar a tudo. Aprendi-o no espaço de alguns dias. Poderei talvez ficar aqui um mês ainda, antes que este entorse à regulamentação seja descoberto (o facto de viver em casa duma família não judaica)."

"Journal 1941-1943" (Etty Hillesum)


Hoje li em "O Público" a crónica dum médico psiquiatra que observa, como outros já o fizeram antes, uma certa infantilização na nossa sociedade, pelo facto de, nas últimas décadas, só ouvirmos falar em direitos e nunca da outra face dos direitos que são os deveres e as obrigações. "E, mesmo que sejam dadas todas as oportunidades, se porventura houver alguém que não alcança uma aspiração, isso raramente é atribuído a um fracasso pessoal, mas a uma discriminação, mesmo que muitas vezes nem sequer tenha havido qualquer esforço para se obter sucesso." O resultado é uma "baixa tolerância à frustração".

No entanto, como diz Etty, bastam alguns dias para aprendermos a renunciar a tudo, lição que trazida pela necessidade não só nos torna mais adultos como nos dá o verdadeiro sentimento da vida.

Ela prepara-se para partir para o Inferno (morreu em Auchswitz). "Vou pôr os meus papéis em ordem; cada dia digo adeus. O verdadeiro adeus não será mais do que uma pequena confirmação exterior daquilo que será cumprido em mim dia a dia."

1 comentários:

Anónimo disse...

Não tenho grande inclinação para santos mas, não posso deixar de reparar que existe um paralelo fortíssimo entre Etty e a santa da pequena via (a única que me fascinou ao ponto de ter lido a obra completa, editada pelo Carmelo).

Maria Helena